Da coivara à reencarnação de Nero na Hileia

Esta semana ainda há alguns rescaldos diplomáticos a esclarecer e, entre gafes, baixarias e chamuscados, descobrir que o mundo segue rápido a caminho de mais uma temida recessão. Quando o assunto é Amazônia falta bom-senso e conhecimento e sobram bazófias que fazem da fumaça da floresta uma cortina para debater as questões do Clima, da China, dos Donalds, de braços dados, sendo um deles o Primeiro Ministro Inglês que mandou fechar o Parlamento Britânico, despachou uns trocados para \”salvar a Amazônia\” e foi tomar chá das cinco com Rainha Elizabeth para agradecer seu apoio para sair da União Europeia. Se os atores da questão das queimadas consultarem o Google vão descobrir que o termo coivara, usado por alguns correspondentes estrangeiros para exemplificar as raizes da fumaça, só precisa mudar a pronúncia, a palavra é a mesma em Portugal e adjacências europeias.

É pouco provável que os líderes de Biarritz saibam o que significa Coivara, um regime agrícola rudimentar tradicional de comunidades quilombolas no Brasil. Inicia-se a plantação através da derrubada da mata nativa, seguida pela queima da vegetação. Há, então, a plantação intercalada de várias culturas (rotação de culturas), como o arroz, o milho e o feijão, durante 3 anos. Além disso, nesta época do ano, no Verão Amazônico, este fenômeno ocorre desde sempre, e é bem vindo para as populações tradicionais. O que não é usual, muito menos legal, é o \”Dia do Fogo\” para o qual foi invocado o desvario piromaníaco de Nero, o Imperador que pôs fogo em Roma. Ironias à parte, o fato é que a Raquel Dodge, a Procuradora Geral da República, PGR pediu para investigar o crime em alguns municípios da região.

Bem, para colocar rigor na conversa, escalamos o Professor Augusto Rocha, um dos Conselheiros da Coluna Follow Up, do Centro da Indústria do Estado do Amazonas, e do DCI BrasilAmazônia Agora, para extrair desse fogaréu oportunista as questões que, decididamente, interessam e precisam ser levadas a sério, supondo sempre a necessidade de líderes que sejam gestores aptos a por a mão na massa. Antes do próximo verão, se possível. Confira!!!

As labaredas da Amazônia

Augusto César Barreto Rocha(*)

O mundo descobriu as queimadas na Amazônia. Que bom. Assim, talvez comecemos a dar atenção para a nossa região. Isso também será útil para que os moradores da Amazônia comecem a olhar para a riqueza disponível, pois, no discurso, a cobiça internacional surge entre as críticas baseadas em verdades e em notícias falsas, com fotos com mais de uma década, apesar de sabermos que em breve chegarão as fotos do presente. Nada melhor que a cobiça estrangeira para nos alertar sobre a nossa própria riqueza.

Sempre tivemos grande dificuldade para destacar para nós mesmos e para o Brasil a importância da região e o enorme conjunto de oportunidades que aqui existem. Em toda esta discussão, que passou a povoar a mídia global nos últimos dias, há vários extremistas. Assim, não fazer nada e destruir tudo são os alarmes que soaram. Entretanto, ainda não emergiu o caminho do meio. Mesmo com a frase provocativa do Ministro Ricardo Sales sobre como gerar dinheiro com a região.

Vazio de lideranças

Apenas uma dinâmica me incomoda em toda esta discussão: por que a liderança do processo de desenvolvimento da região está fora daqui? Como temos uma liderança tão fraca que não tomamos a dianteira deste processo dizendo o que queremos? Quais as razões históricas que levam a esta passividade? Por que a cobiça brasileira e internacional não é percebida por todos? Já passou da hora dos líderes da região começarem a determinar como será o jeito responsável de usar os recursos desta enorme diversidade, para o sucesso, prosperidade e desenvolvimento. Entretanto, a ignorância sobre a nossa realidade permeia todos nós. É preciso esclarecer aos interlocutores de outras localidades que não existe uma Amazônia, mas múltiplas e exponenciais, por conta de seu tamanho e diversidade de microclimas, microambientes e enorme extensão territorial.

Estratégias de desenvolvimento

Portanto, faz-se necessário que se criem múltiplas estratégias de preservação, desenvolvimento e exploração responsável de seus recursos. Não faltarão olhares de cobiça e de busca do alarmismo, afinal é mais fácil vender jornais e audiência com a catástrofe do que com a prosperidade alheia. Assim, cabe-nos começar um movimento pela responsabilidade e equilíbrio na discussão sobre a região. Afinal, destruir como outros destruíram é tão estúpido quanto a inércia que tem paralisado a gestão da região, enquanto grileiros, micróbios e estrangeiros a roubam e a corroem por dentro, desde sempre.

Enquanto não houver múltiplas estratégias para cinco ou seis prioridades para cada mesorregião, teremos apenas falácias sendo proferidas. Precisamos eleger prioridades que não serão as únicas em toda a região. Precisamos ter o império de regulamentos viáveis de serem cumpridos pelo padrão econômico da população da Amazônia, sob a pena de sermos invadidos por multinacionais com seu capital e tecnologia, onde experimentaremos novos tipos de colonialismo, como aconteceu pouco a pouco com a soja, ao longo das últimas décadas.

Aceitação da condição de celeiro do planeta

A região pode ser um celeiro de fármacos, de insumos e de riqueza para todos do planeta, desde que tenhamos a habilidade de lidar com os desafios que se apresentam. Toda crise é uma enorme oportunidade e, neste momento que o mundo nos olha, temos uma enorme oportunidade de conduzir um debate sereno, hábil, urgente e amplo com o propósito de implantar meios responsáveis de uso da riqueza. Inimigos externos são um bom caminho para a união.

*Augusto César Barreto Rocha é articulista convidado, doutor em Engenharia de Transportes (COPPE/UFRJ), professor da UFAM (Universidade Federal do Amazonas), diretor adjunto da FIEAM, Coordenador da Comissão de Logística do CIEAM.

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