Por Daniel Reis / CNN
O candidato do PT Luiz Inácio Lula da Silva, de 77 anos, foi eleito neste domingo (30) presidente da República pela terceira vez, após superar no segundo turno o presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição.
O petista sustentou a vantagem nas urnas obtida no primeiro turno. Em 2 de outubro, Lula obteve 48,43% dos votos totais, contra 43,2% do atual mandatário. Na ocasião, isso representou uma diferença de quase 6,2 milhões de votos. O número de votos nulos chegou a 2,82%, e o de votos brancos, a 1,59%.
Lula e Bolsonaro protagonizaram a primeira eleição da história do Brasil disputada por dois políticos que já comandaram o país. O ex-metalúrgico exercerá seu terceiro mandato tendo como vice um ex-adversário, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSB).
O resultado confirmou o favoritismo do petista apontado na maioria das pesquisas de intenção de voto.
Desde que restabeleceu seus direitos políticos em 2021 após anulação das condenações da Lava Jato pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-presidente ganhou força na disputa e buscou construir uma “frente ampla” de oposição a Bolsonaro.
No segundo turno, ele conseguiu o apoio da terceira colocada na disputa à Presidência, a senadora Simone Tebet (MDB).
Durante a campanha, Lula formou uma coligação com dez partidos que, além do PT, abarcou o PSB, Solidariedade, PCdoB, PSOL, Avante, PV, Rede, Pros e Agir.
Com o resultado, Bolsonaro se torna o primeiro presidente ocupante do cargo a sair derrotado na tentativa de se reeleger. Desde que o instituto da reeleição foi aprovado pelo Congresso, em 1997, Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 1998; Lula, em 2006; e Dilma Rousseff (PT), em 2014, conquistaram um segundo mandato.
O atual chefe do Executivo não conseguiu superar a rejeição ao seu nome nas urnas. Seu governo atravessou a pandemia de Covid-19, que provocou quase 700 mil mortes no país, e a guerra entre Rússia e Ucrânia, que contribuiu para elevar os preços das commodities, como combustíveis e alimentos. O mandato do presidente também foi marcado por tensões com o Judiciário.
Anulação das condenações: o início do pleito para Lula
Alvo de investigação e condenação na Operação Lava Jato, Lula foi preso em abril de 2018, condenado sob acusação de corrupção passiva e lavagem de dinheiro na ação envolvendo o triplex de Guarujá (SP).
Segundo o Ministério Público, ele teria recebido propina da OAS em troca de favorecimento em contratos com a Petrobras. O pagamento teria sido feito, segundo a acusação, com a reserva e reforma de um apartamento na cidade do litoral paulista.
Antes de se entregar à Polícia Federal, Lula se cercou de aliados e apoiadores no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Parte de seu entorno queria que o petista resistisse à prisão e buscasse asilo em alguma embaixada estrangeira, mas ele optou por se entregar.
O ex-presidente permaneceu por 580 dias na prisão, em Curitiba, até novembro de 2019.
Durante esse período, foi impedido de disputar a eleição presidencial de 2018. À época, o PT chegou a anunciar a candidatura de Lula, mas ela foi barrada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com base na Lei da Ficha Limpa.
Em 2021, o ministro do STF Edson Fachin considerou que a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha competência para julgar os casos ligados ao ex-presidente porque, em seu entendimento, eles não tinham relação direta com a Petrobras. A decisão foi confirmada pelo plenário da Corte em 15 de abril daquele ano, por oito votos a três.
Posteriormente, a corte julgou o ex-juiz Sergio Moro, responsável pela condenação de Lula, como suspeito nas ações contra o ex-presidente.
Ex-presidente constrói “frente ampla”
Após a série de vitórias na Justiça, o ex-presidente buscou atrair apoio de aliados e até ex-adversários políticos para criar uma “frente ampla” em torno da sua candidatura e em oposição à reeleição de Bolsonaro.
Em setembro, ainda no primeiro turno, oito ex-candidatos à Presidência declararam apoio a Lula em evento com o petista. O maior símbolo dessa frente, assim como da “guinada ao centro” do ex-presidente, foi a presença de Alckmin como vice na chapa de Lula. Em 2006, quando o ex-governador de São Paulo estava no PSDB, eles disputaram o segundo turno da corrida presidencial.
A aliança entre o ex-tucano e o petista foi interpretada como uma sinalização de moderação e aceno a setores refratários ao PT.
No segundo turno, novos nomes declararam apoio a Lula. Entre eles, os candidatos derrotados à Presidência, Simone Tebet, que aderiu à campanha do ex-presidente participando de comícios e inserções no horário eleitoral do petista, e o ex-ministro Ciro Gomes (PDT), quarto colocado na disputa pelo Planalto. O pedetista seguiu a orientação do seu partido, mas ao declarar apoio à candidatura do PT não citou o nome do ex-aliado e não participou da campanha do segundo turno.
Os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e José Sarney (MDB) também manifestaram a favor do voto em Lula no segundo turno.
A caminhada ao centro do ex-presidente foi ainda mais acentuada nas semanas finais da campanha eleitoral. Em discurso na segunda-feira (24), Lula afirmou que seu novo mandato não será “um governo do PT, mas do povo brasileiro”. Ao seu lado, estavam, além de Tebet, o ex-ministro da Economia Henrique Meirelles (MDB) e o economista Pérsio Arida, um dos idealizadores do Plano Real.
Segundo turno marcado por ataques
O segundo turno da eleição presidencial foi marcado pela troca de ataques entre Lula e Bolsonaro e a propagação de desinformação por parte das campanhas. Na tentativa de aumentar a rejeição do adversário, os candidatos destacaram temas como religião, aborto e pedofilia.
O TSE chegou a conceder 164 inserções a Lula na propaganda eleitoral de Bolsonaro como direito de resposta por seu adversário associá-lo a criminosos. Após o cálculo da decisão ser refeito, o petista pôde veicular 24 inserções.
Propagandas de Lula também foram retiradas do ar pelo tribunal. Em uma delas, a campanha petista associava Bolsonaro ao canibalismo, retirando frases do presidente de contexto.
Nas redes sociais, o TSE determinou que fossem elaborados relatórios diários sobre as postagens das redes sociais do vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro (Republicanos), filho do presidente e responsável pelo marketing digital da sua campanha, e do deputado federal André Janones (Avante), que liderou a estratégia digital da campanha petista.
Campanha adia plano de governo
Lula não chegou a apresentar um plano de governo finalizado durante o período eleitoral deste ano. Ao divulgar, inicialmente, as diretrizes do programa, disponível no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sua campanha tratou o documento como “um rascunho”.
Questionado sobre responsabilidade fiscal, o ex-presidente afirmou que ele e Alckmin governarão com estabilidade, previsibilidade e credibilidade. Durante a campanha, Lula afirmou que acabará com o teto de gastos.
Segundo o petista, seu governo será a combinação da sua experiência como presidente por oito anos (2002-2010) e a de seu vice como ex-governador de São Paulo por 14 anos (2001-2006 e 2011-2018).
Nos últimos meses, durante comícios com apoiadores e diálogos com empresários, Lula reforçou feitos de seu governo na economia, na inclusão social e no combate às desigualdades, ao passo que se esquivou de respostas sobre medidas econômicas da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), destituída do cargo por meio de um impeachment em 2016.
A três dias do segundo turno, o ex-presidente lançou a “Carta para o Brasil do Amanhã”, um documento com propostas para o seu eventual governo no qual se compromete a fazer um governo com responsabilidade fiscal e combater a pobreza.
A trajetória política de Lula
O 39º presidente do Brasil nasceu em Caetés, que, à época do seu nascimento, pertencia ao município de Garanhuns, em Pernambuco. Durante a infância, migrou para o estado de São Paulo. Iniciou a carreira política como presidente do Sindicato do Metalúrgicos do ABC, nos anos 1970.
Em 1980, fundou o Partido dos Trabalhadores (PT). Candidatou-se a governador de São Paulo em 1982 e, em 1986, foi eleito deputado federal. Na ocasião, participou da Assembleia Constituinte, responsável pela elaboração da Constituição de 1988.
Disputou as eleições de 1989, 1994 e 1998 ― terminando todas elas na segunda colocação ― até ser eleito em 2002 e reeleito em 2006.
Em 2010, no último mês do seu governo, 83% dos entrevistados pelo Datafolha avaliaram a gestão de Lula como “boa ou ótima”.