Amazônia e seus desafios como destino turístico  

Apesar da riqueza cultural e ambiental, estados da região ainda não aparecem entre as preferências para as férias de boa parte dos brasileiros. Realização da COP 30 em Belém é uma das apostas para mudar essa realidade
Praia do Farol Velho, em Salinópolis, no Pará. Foto: Fernando Sette Câmara

Por Yasmim Tabosa, PIM Amazônia

A Amazônia é o maior bioma do planeta. A grandiosidade de sua fauna e flora, que se estendem por nove países (Brasil, Paraguai, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana Francesa e Suriname), atrai olhares de todo o mundo. Cachoeiras, trilhas na floresta, rios, artesanato, arquitetura, culinária, grandes centros culturais e históricos são alguns dos atrativos para quem enxerga a região como um destino turístico.

Porém, apesar de todos os seus diferenciais e encantos, a Amazônia ainda não é a principal escolha de boa parte dos brasileiros nas férias, sendo um lugar desconhecido por muitos, seja por questões logísticas, financeiras ou mesmo pela falta de informações sobre os atrativos turísticos da região.

Em dezembro de 2023, a Preply, plataforma de ensino de idiomas e e-learning (aprendizado digital), entrevistou mais de mil pessoas sobre os destinos preferidos para as férias de 2024 e constatou que 60% deles optam por viagens no Brasil, porém, apenas dois estados da Amazônia Legal (Maranhão e Amazonas) se destacaram entre as escolhas:

  • Bahia (BA): 27%
  • Santa Catarina (SC): 25%
  • Rio de Janeiro (RJ): 23%
  • Ceará (CE): 22%
  • Rio Grande do Sul (RS): 20%
  • São Paulo (SP), Minas Gerais (MG) e Pernambuco (PE): 16%
  • Alagoas (AL) e Rio Grande do Norte (RN): 13%
  • Maranhão (MA): 11%
  • Amazonas (AM): 10%
  • Paraná (PR): 8%
Rua do Giz, em São Luís (MA). Foto: Paulo Pontes / O Imparcial

Vale lembrar que, no Brasil, a Amazônia abrange parte do Maranhão e os estados do Amazonas, Pará, Roraima, Rondônia, Mato Grosso, Acre, Tocantins e Amapá. Dados do IBGE de 2021 indicam que a região ocupa 5.015.068,18 km², correspondentes a cerca de 58,9% do território brasileiro (8.510.295,914 km²), com os 9 estados e seus 772 municípios.

No entanto, desses, em dezembro de 2023, apenas 280 (36,2%) estavam incluídos no Mapa do Turismo Brasileiro, um instrumento do Programa de Regionalização do Turismo na definição das áreas a serem trabalhadas prioritariamente pelo Ministério do Turismo (MTur), no desenvolvimento das políticas públicas.

O Mapa é importante porque é uma das bases consideradas para a destinação de recursos pelo Governo Federal para a elaboração e/ou revisão planos, estudos e planejamentos, visando o fortalecimento e o investimento em obras de infraestrutura turística e oferta de cursos, como os de qualificação profissional, por exemplo.

“A partir da sua inclusão, a cidade recebe uma classificação crescente D, C, B e A, dependendo de critérios relacionados à economia do turismo, como: a Quantidade de Estabelecimentos de Hospedagem; Quantidade de Empregos em Estabelecimentos de Hospedagem; Quantidade Estimada de Visitantes Domésticos; e Quantidade Estimada de Visitantes Internacionais”, informou o Ministério do Turismo em nota enviada à PIM Amazônia.

Critérios – Para fazer parte do Mapa, o primeiro passo é realizar uma solicitação via plataforma do Mapa do Turismo Brasileiro, disponível durante todo o ano para o cadastro de novos destinos e que, portanto, pode ser atualizada a qualquer tempo.

Contudo, existem critérios, compromissos e procedimentos estabelecidos pelo Ministério, em conjunto com as unidades federativas, que devem ser seguidos, conforme listado na Portaria Ministerial nº41/2021. Ainda assim, os estados e o DF podem definir exigências complementares, que devem ser igualmente respeitadas.

Cachoeira do Brejo Limpo, em Porto Alegre do Tocantins (TO), um dos municípios no Mapa do Turismo. Foto: Divulgação/BR Central Aventuras

Dentre as exigências para ser inserido no mapa, está a de ter uma secretaria/departamento para o turismo, além de ter recursos para o setor previstos na Lei Orçamentária Anual, dispor de prestadores de serviços turísticos de atividade obrigatória regular registrados no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur), do Ministério do Turismo, ter um Conselho Municipal de Turismo Ativo, apresentar termo de compromisso assinado pelo prefeito municipal e pelo dirigente responsável pela pasta de Turismo, aderindo, de forma espontânea e formal, ao Programa de Regionalização do Turismo, e preencher a aba referente a atividade turística dos municípios.

Por fim, os municípios também devem comprovar a existência de uma instância de governança regional no turismo, como um conselho, fórum, comitê ou associação responsável por sua gestão, sendo essas nuances possíveis desafios no momento de aprovação para a inclusão no Mapa.

Ainda segundo o Ministério do Turismo, em 2023, foi percebida uma maior movimentação no setor no país. Porém, o MTur não forneceu os dados específicos sobre a Amazônia, limitando-se a informar que, em novembro de 2023, o Brasil, como um todo, registrou a entrada de 504.395 visitantes do exterior, crescimento de 7% em relação a 2022.

“Ainda estamos fechando os dados referentes ao ano de 2023, mas as perspectivas são as melhores possíveis”, apontou o MTur, em resposta à PIM Amazônia.

Custo alto da passagem aérea é um dos pontos de reclamação

Marcel Nascimento tem 41 anos, é servidor público estadual do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe. Ele se autodefine como um apaixonado por viagens, e, embora, tenha viajado para nove países e por diferentes estados do Brasil, a Amazônia nunca entrou em seus planos prioritários de viagem.

Marcel Nascimento em Paris, na França. Foto: Arquivo pessoal

O servidor público conhece a Argentina, México, Itália, França, Bélgica, Holanda, Alemanha, Vaticano e Chile, visitou quase todas as regiões brasileiras – tendo passado inclusive, por duas vezes, pelo Maranhão, que em parte integra Amazônia Legal, mas nunca esteve em um estado da Região Norte, onde fica a maior parte da Amazônia Brasileira.

Marcel afirma que a oportunidade ainda não aconteceu, não por desinteresse, mas porque tem o custo da viagem como o seu maior obstáculo.

“Eu sempre tive vontade de conhecer Belém (PA), mas sempre houve uma grande dificuldade de ir para o Norte, dificuldade no sentido de passagem aérea mesmo. Acaba saindo um custo muito alto como se fosse fazer uma viagem internacional. Então, acho que isso acaba sendo um grande limitador”, explicou Marcel.

Ele ainda compartilha que, até conhecer moradores da região amazônica, tinha uma visão muito limitada sobre o que poderia encontrar nos estados da região. Para ele, parte da responsabilidade é individual, por não ter pesquisado mais a respeito, mas ele também acredita que parte dessa responsabilidade se deve ao fato de não haver uma divulgação adequada da Amazônia.

“Eu fiquei surpreso quando descobri sobre Belém ser uma cidade boêmia, muito rica, culturalmente falando, e isso, na verdade, fez até aumentar minha vontade de conhecer. Manaus, especificamente, eu também tenho essa visão restrita, mais da parte da floresta e da Zona Franca, mas acredito que também tem muito oferecer e a apresentar, assim como a Região Norte como um todo”, destacou.

Embratur mira no incentivo à bioeconomia e nas visitas a unidades de conservação

Ampliar o turismo internacional é também uma das possibilidades que se colocam, especialmente após a escolha de Belém (PA) para sediar um dos maiores eventos do mundo – a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP), na sua 30ª edição, em 2025. Durante os Diálogos Amazônicos, realizados em 2023, na capital paraense, o presidente da Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur), Marcelo Freixo, já havia sinalizado o turismo como ativo importante da bioeconomia, que tem sido destacada como uma das soluções para o desenvolvimento da região.

“O turismo é uma possibilidade, uma solução possível nesse projeto de bioeconomia. Uma das poucas e melhores possibilidades de compatibilizar desenvolvimento com conservação. A gente pode conservar floresta, memória e história, dos povos e da floresta, ao mesmo tempo que isso representa geração de emprego e renda”, afirmou.

Outro potencial que pode ser melhor explorado, na avaliação da Embratur, é o turismo em unidades de conservação. Alinhado a este pensamento, em 16 de dezembro de 2023 a Embratur, os ministérios do Turismo e do Meio Ambiente e o Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio), assinaram um acordo para ampliar visitação turística em unidades de conservação do país.

Estação ecológica Rio Acre (AC) é uma unidade de conservação federal. Foto: Divulgação/ Estação Ecológica

Pelos dados da Embratur, em todo o Brasil, há 336 unidades de conservação, das quais 146 estão localizadas na Amazônia Legal. A área total é de 1,7 milhão de quilômetros quadrados, o equivalente a 20% do território nacional. As 137 unidades monitoradas pelo ICMBio em 2022 receberam 21,6 milhões de visitas turísticas.

O acordo firmado em dezembro visa qualificar os serviços turísticos, melhorar sinalização e infraestrutura, desenvolver ferramentas de gestão e monitorar a visitação. Além disso, pretende promover internacionalmente destinos com unidades de conservação preparadas para receber turistas estrangeiros. Há ênfase na importância da sustentabilidade, considerando não só a conservação da biodiversidade e a recuperação de áreas degradadas, mas também a integração sociocultural, a redução dos efeitos das mudanças climáticas e a geração de empregos e renda.

Etnoturismo – Um pouco depois, em 20 de dezembro, o turismo de base comunitária e o Etnoturismo (tipo de turismo em que os viajantes conhecem de perto a vida, os costumes e a cultura de um determinado povo, especialmente povos indígenas) na Amazônia foram os temas da pauta de uma reunião entre o presidente da Embratur e o titular da Secretaria de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Rodrigo Rollemberg

O foco do encontro foi avaliar o potencial do etnoturismo para promover autonomia, desenvolvimento cultural e econômico das comunidades indígenas, além de contribuir para a proteção ambiental. A parceria também envolve o Ministério dos Povos Indígenas e a Funai, visando consolidar um comitê gestor para executar ações do programa.

A equipe da PIM Amazônia entrou em contato com a Embratur para mais detalhes sobre parcerias, planos e desafios para a Amazônia, mas não recebeu respostas até o fechamento desta reportagem.

Pará tem 50 municípios no Mapa do Turismo

Em janeiro de 2024, com a inclusão de mais 13 cidades, o estado do Pará, que receberá a COP 30, em 2025, alcançou a marca de 50 municípios presentes no Mapa do Turismo. As inclusões recentes foram Salinópolis, Salvaterra, Itaituba, Trairão, Aveiro, Maracanã, Tucuruí, Cametá, Rio Maria, Piçarra, Tucumã, Água Azul do Norte e Portel. Ainda assim, o número ainda não contempla nem metade dos 144 municípios do estado.

O Pará possui 14 Regiões Turísticas compondo o Sismapa, a plataforma online que permite aos municípios brasileiros se cadastrarem e atualizarem seus dados no Mapa do Turismo Brasileiro.

Belém vista da Ilha do Combu, um dos pontos turísticos famosos entre turistas nacionais e estrangeiros. Foto: Monique Renne

Com a confirmação de Belém como sede da COP 30, a capital vem sendo destacada como um dos destinos turísticos da região que precisam ter um crescimento exponencial. Ainda em junho de 2023, o secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, André Corrêa Lago, afirmou, em notícia divulgada no site do Governo Federal, que o evento vai exigir um grande esforço em termos de impulsionar a movimentação na cidade, que deve esperar mais de 50 mil visitantes durante o evento.

“Todas as cidades que convidam para que a COP aconteça têm que fazer um grande esforço para o evento. É um evento que, nos últimos anos, tem uma média de 40 mil a 50 mil pessoas durante duas semanas. É a maior conferência das Nações Unidas”, afirmou o secretário, à época.

Em resposta a PIM Amazônia, o Ministério do Turismo afirmou que, ao longo de 2024, irá anunciar um conjunto de ações e medidas voltadas à preparação da COP 30, que “lançará luz” sobre todo o potencial turístico não apenas do Pará, como de toda a região amazônica, mas ressaltou que esse é não é um trabalho exclusivo, mas um conjunto de ações do Governo Federal e outros Ministérios.

Ainda em agosto de 2023, durante reunião na Secretaria do Clima e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, o presidente da Embratur, Marcelo Freixo afirmou:

“A gente está muito empenhado em colocar a pauta do turismo dentro da COP-30, em buscar mecanismos para fazer com que o turismo esteja no centro do debate para o que vai acontecer depois do evento. No pós-COP, o legado que precisamos deixar é de um turismo jogando papel decisivo como atividade econômica sustentável, que garante a conservação da natureza. O turismo é parte da solução”.

A equipe da PIM Amazônia entrou em contato com a Embratur e a Secretaria do Turismo do Pará para mais informações sobre parcerias, oportunidades e desafios do setor antes, durante e depois da COP 30, mas não obteve respostas até o fechamento desta reportagem.

MTur tem R$ 100 milhões em crédito para empreendimentos no Pará

Com vistas à COP 30, o Ministério do Turismo disponibilizou um crédito suplementar de R$ 100 milhões para incentivar o setor turístico no Pará, via Fundo Geral de Turismo (Fungetur), um mecanismo de crédito essencial ao fomento do turismo como negócio e estratégia para o desenvolvimento social e econômico.

Os recursos permitirão que empreendimentos turísticos registrados no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur) utilizem recursos para compra de equipamentos, reforma e modernização de empreendimentos, além do uso para capital de giro.

Além disso, em novembro de 2023, o Governo Federal destinou R$ 38,7 bilhões ao estado do Pará. O anúncio foi feito durante a cerimônia de lançamento das obras do Novo PAC, que detalhou o plano de investimentos para a região. Os recursos, destinados a melhoria de áreas como infraestrutura, transportes, saúde e educação, também trarão impacto à atividade turística paraense. Serão revitalizados, por exemplo, obras em atrativos turísticos como a famosa Feira Ver-o-Peso.

Esses recursos também permitirão ao estado investir na melhoria dos aeroportos de Belém, Altamira, Parauapebas, Marabá e Santarém e dos portos de Barcarena/Vila do Conde, Belém e Santarém, que terão recursos para arrendamento e requalificação.

Manaus entre as favoritas de estrangeiros em janeiro de 2024

Segundo a Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur), Manaus (AM) será uma das capitais brasileiras mais procuradas por turistas estrangeiros em janeiro de 2024, com aumento de 23,7% no número de visitantes internacionais, comparado ao mesmo período de 2023. Mais de R$ 420 milhões foram injetados na economia do Amazonas pelo turismo no primeiro semestre de 2023, de acordo com dados da Amazonastur, a Empresa Estadual de Turismo do Amazonas.

Pria da Ponta Negra, em Manaus. Foto: Janailton Falcão/ Amazonastur

Segundo a Amazonastur, 41,27% dos turistas estrangeiros que vêm a Manaus têm como principal motivação as atividades de lazer. Dentre as atividades preferidas realizadas, destacam-se:

1) Passeios/Cruzeiros nos Rios do Amazonas (68,92%);

2) Passeios na floresta (44,59%);

3) Aventura (36,49%);

4) Visitar amigos/parentes (25,68%);

5) Visita à Comunidades Indígenas (22,97%)

Ainda segundo as informações da Amazonastur, com o objetivo de fortalecer a capital do Amazonas, foram realizadas pelo Estado ações voltadas para a ampliação da malha aérea, capacitação de profissionais do turismo, ordenamento turístico, divulgação do destino e investimento em ferramentas tecnológicas.

A ampliação da malha aérea inclui novas rotas internacionais, como voo que conecta Manaus a Bogotá, na Colômbia, sem escalas, além de rotas nacionais saindo do Aeroporto Internacional Eduardo Gomes, para o Rio de Janeiro (RJ) e voos diretos para São Paulo (SP) e Belém (PA).

Para aumentar oportunidades de trabalho e qualificação no setor, a Amazonastur também promoveu a capacitação de 800 profissionais pelo workshop ‘Bem Receber’ em 11 municípios. E aproximadamente 293 pessoas foram qualificadas no curso de Condutor de Pesca Esportiva.

Além disso, em fevereiro 2023, foi lançado o “Brilha Amazonas”, com objetivo de levar kits de painéis solares para as comunidades que têm o turismo como fonte de renda, gerando energia limpa.

Já o Plano de Ordenamento Turístico (POT) foi um dos eixos fortalecidos pela Amazonastur, realizando trabalhos de sensibilização para formalização dos serviços turísticos por meio do Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur). Em quatro anos, o número de empresas incluídas no sistema cresceu 130,56%. As ações de ordenamento também alcançaram as comunidades indígenas com objetivo de promover o etnoturismo.

Teatro Amazonas, uma das riquezas arquitetônicas e culturais de Manaus. Foto: Raphael Alves/ TJAM
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