Até chegar ao posto de diretor de sua empresa e empregar mais de 200 pessoas, o engenheiro elétrico Luciano Benitah, um ferrenho defensor de políticas diferenciadas para médias e pequenas indústrias, iniciou sua trajetória como um estagiário aos 16 anos. Com experiência em duas, porém importantes empresas (uma delas na Philco), Benitah seguiu os passos do pai que também trabalhava no PIM. Em 2006, após sentir uma brisa econômica positiva e acreditar bastante no potencial do polo eletroeletrônico, o então engenheiro com carreira em ascenção decidiu se aventurar no seu próprio empreendimento, surgindo daí a Venttos Tecnologia e Resultados (hoje, Venttos Eletronics), voltada para o segmento de software para a indústria. Além dos serviços de consultoria e implantação de modelos de gestão em indústrias, o diretor entrou no ramo de aluguel de máquinas, após adquirir os equipamentos em um leilão em São Paulo, o que foi grande responsável pela capitalização do negócio. Nesta entrevista à Revista PIM Amazônia, Benitah confessa que se considera um sobrevivente da última crise, mas que não passou por ela imune à sequela e sem tomar medidas preventivas.
Como foi essa transição de uma empresa de software e aluguel de máquinas para entrar no ramo de industrialização?
Com a crise em 2008/2009, e consequente queda no aluguel das máquinas, a Venttos decidiu colocar os equipamentos para produzir e entramos também no ramo de manufatura, principalmente voltada a indústria de componentes eletrônicos. Toda nossa experiência que tínhamos acumulado de melhor na área eletrônica aplicamos na nossa empresa. Somamos, eu e meu sócio, a competência e tudo o que tínhamos desenvolvido no mercado e trouxemos para nossa empresa e isso começou a dar frutos, pois todo ano aumentávamos de tamanho. Começamos com 600 metros quadrados e hoje estamos com 6 mil metros quadrados de fábrica e pensando em aumentar. Então, atualmente nós temos basicamente três modelos de negócio: a industrialização tradicional; o modelo turning key, entregando o produto finalizado pronto por encomenda de acordo com aa especificações do cliente; e o modelo alocação, uma espécie de incubadora onde damos toda infraestrutura para a empresa produzir no nosso parque industrial.
Qual tem sido a média de crescimento nos negócios da empresa? Conseguiram se manter mesmo com a crise?
Antes da crise, a gente estava crescendo em torno de 60%, ao ano. Quando aconteceu a \”pré-crise\”, ainda crescemos nesse patamar. Mas a crise de 2016 realmente destruiu naquele primeiro semestre o nosso faturamento. A gente perdeu 40% no nosso faturamento de janeiro a julho de 2016. Além do faturamento, algumas empresas resolveram sair em decorrência da crise. Porém, percebi que empresas que estavam mal das pernas e já apresentavam (alguns problemas como) financiamento de galpão e falta de fluxo de caixa correto, quebraram rapidamente. Quem não tinha as contas ajustadas foram as primeiras devastadas. No segundo semestre de 2016, a gente tornou a crescer, tanto que em outubro recuperamos em 40% o faturamento. Para quem estava negativo no primeiro semestre, conseguimos finalizar o ano com as contas equilibradas. Não fizemos loucuras ou aquisições grandiosas, trabalhamos com o pé no chão e isso nos ajudou a não quebrar.
Em pouco mais de 10 anos, a empresa enfrentou duas crises econômicas. Você consegue fazer um paralelo entre esses dois momentos? O que a primeira trouxe de experiência para enfrentar a recessão em 2016?
Foram experiências diferentes. A primeira não se compara com o que aconteceu em 2016. Eu posso dizer que eu sobrevivi a 2016, porque foi algo inimaginável. Acho que vão ter empresários que poderão dizer que são sobreviventes e outros não. A gestão financeira tem importância grande, pois você pode ter, mas se não tiver gestão financeira correta, não consegue suportar uma perda forte de capital. Alguns empresários usaram empréstimos e parcerias concentrando seu business em um só grande cliente e é algo que não seguimos. Desde o início, criamos essa política de pulverização da carteira de clientes. Nunca negligenciamos a gestão financeira, apostando inclusive na informatização e isso fez toda diferença em 2016. A gente estava preparado para a crise.
Então vocês não foram pegos de surpresa com essa crise. Vocês mantinham em curso estratégias para minimizar esses impactos negativos.
De setembro para outubro de 2015, já percebíamos sinais de que esse trem ia descarrilar e muita gente estava no oba! oba! mas a gente puxou o freio (nos investimentos e projetos). Comecei a tomar providências para evitar um colapso. Enxuguei custos e a fábrica na hora certa. Quando a crise se perpetuou e ficou evidente, a gente já estava pronto para mergulhar e esperar muito tempo até tsunami passar. Quando a gente submergiu, o tsunami ainda estava lá, perdemos muito em faturamento, mas não foi o suficiente para nos destruir.
Essa sobrevivência não deve ter sido livre de sequelas ao seu negócio. Quais foram e o que você tirou de aprendizado?
Sequelas no negócio foi para os acionistas. Não tivemos pró-labore nesse período. Toda a rentabilidade por seis meses foi negativa, o que afeta também a nossa vida pessoal. Todo o dinheiro foi empregado para manter o negócio funcionando. Deixamos de ganhar muito dinheiro, pois tivemos que cortar da própria carne para pagar funcionários e manter o negócio vivo.
Depois desse momento negativo, você enxerga perspectiva de crescimento do segmento que a Venttos atua?
Crescimento depende de um conjunto de ações que está além do meu querer. Nosso potencial, do PIM, não é totalmente aproveitado. Muitas empresas têm o desejo de se instalar no Amazonas, mas além dos gargalos que já enfrentamos, temos uma desinformação muito grande. Tive oportunidade de viajar para algumas feiras e conhecer empresas que buscavam soluções de redução de custo, fazendo consultoria para a viabilidade de instalação no PIM com possibilidade de parceria na produção. Hoje, essas empresas estão instaladas gerando emprego, mas percebo que falta uma divulgação maior da modelo zona franca. Falta um entendimento maior do empresariado de Manaus de não esperar só pela Suframa e criar alternativas para atrair esses negócios. Hoje essa questão está muito concentrada para que a Suframa faça, quando na verdade todos deveriam procurar alternativas para atrair, inclusive a iniciativa privada.
Com a atual instabilidade política pela qual passa o País, você tem receio de ataques ao modelo zona franca e aos incentivos fiscais?
Temos mais problemas políticos do que econômicos quando o assunto é Zona Franca de Manaus. Basta olhar imagens de satélite e comparar a preservação da floresta do Amazonas com os Estados vizinhos. A preservação não seria possível se nossa principal atividade fosse a extrativista. O primeiro ponto importante não só para o Brasil mas para o mundo é a questão ambiental. Na questão econômica, os números são positivos, o que precisa é melhorar essa distribuição para os Estados. Quando se fala de zona franca tem que se ter a visão econômica, ambiental, de que toda uma cidade depende disso. Nenhum governante teria a força política para derrubar isso aqui, mas ter políticos bons regionais que defendam esse movimento com a ajuda das empresas, já funciona como uma divulgação do modelo.
Qual sua opinião sobre o estado de conservação que o Distrito Industrial se encontra atualmente?
O que realmente faz esse motor girar é o PIM e a gente não o trata da maneira que deveria. Quando você vai em outro parque industrial (de outro País) chega a dar raiva, porque aqui o lugar que dá mais dinheiro está abandonado. As empresas ficam procurando lugares para não cair nos buracos. É uma falta de visão dos governantes e dos empresários, porque a gente também não faz nada. Desde a época que eu era estagiário se discutia os mesmos gargalos. Como eu desvio desses gargalos? O buraco do Distrito Industrial hoje é a mesma coisa que os gargalos: eles estão lá, historicamente todos sabem do problema e não muda nunca. Se a gente aplicasse um plano de ação para tapar os buracos do distrito? Se prefeitura isentasse de IPTU cada empresa que ajeitasse sua rua o problema seria minimizado. Hoje pagamos quase R$ 40 mil só de IPTU e tenho a frente da minha rua toda esburacada. Algo deveria ser feito, pois pagamos como indústria e precisamos ter a infraestrutura resolvida. Falta mais conversa. A tomada de decisão em nome do empresariado amazonense é ditada por um grupo de empresas, que por seu tamanho, tem maior poder de decisão. Eu defendo a criação de outras classes, pois o Cieam, por exemplo, representa um determinado conglomerado de empresas. As empresas pequenas, menores não têm voz ativa.
Daqui pra frente, quais os principais desafios que o setor deve enfrentar?
Em uma empresa de serviços, algo que pesa bastante é o custo do trabalhador. O modelo tributário trabalhista é muito oneroso. Quando fazemos cálculos para implantação de empresas de fora aqui, o custo trabalhista é decisivo. Você tem que fazer provisões de pagamento de funcionários ao longo do tempo. Se você começa a fazer essa conta no início do negócio, você nem abre a empresa no Brasil. O grande ponto a ser discutido é o trabalhista. Deveria ser algo mais justo, com o funcionário recebendo por aquilo que trabalhou, lógico que mantendo os principais seguros ao trabalhador que são de direito. Porque aquilo que eu pago hoje ao Governo não volta para eles. Não seria uma diminuição (de direitos), mas transformar numa balança mais justa para o trabalhador e empregado, e que esse retorno fosse mais direto ao funcionário.
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