Advogados explicam pontos chave da Reforma Tributária para representantes da Indústria do Amazonas

As mudanças tributárias brasileiras demoram a ser discutidas e implementadas após o processo de redemocratização do país e da Constituição de 1988

Por Fabíola Abess/Simmmem

Evento foi uma realização da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam) e do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Manaus (Simmmem), juntamente com o escritório Marchiori Sachet, Barros & Dias.

Traduzir os termos, desfazer as dúvidas e compreender as complexidades das mudanças do novo sistema tributário brasileiro. Foi com esse objetivo que foi realizada nesta quinta-feira (17/08/2023), no Auditório do Senai Arivaldo Silveira Fontes, na Avenida Rodrigo Otávio, 2394, bairro Distrito Industrial I, zona sul da capital, a palestra “Reforma Tributária Desvendada”.

O evento foi uma realização da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam) e do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Manaus (Simmmem), juntamente com o escritório Marchiori Sachet, Barros & Dias e teve como objetivo apresentar, debater e tirar dúvidas de representantes do setor sobre a Reforma Tributária. Durante a abertura, o vice-presidente da Fieam e presidente do Simmmem, Nelson Azevedo, falou sobre a urgência do assunto:

“Nosso país enfrenta uma encruzilhada econômica, em que a modernização do sistema tributário se faz vital para impulsionar nossa competitividade global. A complexidade atual impede o crescimento saudável das empresas e mina nossa capacidade de atrair investimentos”, salientou Azevedo.

O especialista em direito tributário e um dos sócios do escritório, Geraldo Vinícius dos Santos, falou sobre como as mudanças tributárias brasileiras demoram a ser discutidas e implementadas após o processo de redemocratização do país e da Constituição de 1988.

O advogado lembrou que só o ICMS, por exemplo, só foi regulamentado apenas oito anos depois da Constituinte. E de lá pra cá, o imposto sofreu três alterações significativas, no intervalo de tempo de de 10 e 15 anos entre uma e outra. Geraldo alertou ainda que a reforma ainda está acontecendo e que várias mudanças propostas poderão afetar o modelo do Polo Industrial de Manaus.

“A Reforma chegou ao Senado no dia 03 de agosto. De lá pra cá tivemos 55 emendas, algumas delas podem prejudicar a Zona Franca”.

Para o jurista, é fundamental manter a vigilância para proteção do modelo. César Tadeu Dias Júnior explicou que os conflitos tributários do país são antigos e frutos do momento político em que a Constituição foi elaborada. Por conta da pressa para que a Carta Magna fosse implementada, muitos detalhes do sistema tributário brasileiro foram postergados e deixados a cargo de Leis Complementares, sendo que muitas sequer foram feitas até hoje.

Um dos debates mais importantes para a Zona Franca de Manaus acabou sendo o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que demorou anos para acontecer e só avançou após a avaliação da suprema corte do país.

“No início, nem ao menos os conceitos de insumos e circulação de mercadorias foram estabelecidos, o que levou o debate ao judiciário. O STF passou a julgar e pacificar esses temas, parte em favor do contribuinte, parte em favor de outros setores econômicos”, relembrou Dias.

Sobre a atual proposta de Reforma, o jurista alertou que o Ministério da Fazenda ainda não divulgou o impacto da carga tributária com a nova reforma.

“O discurso é de que simplifique, mas mantenha a carga tributária atual, só que não há garantia nenhuma disso”, afirma.

IVA Dual e Imposto Seletivo

A equipe de advogados explicou ainda o conceito do IVA Dual e o Imposto Seletivo, elementos centrais da Reforma Tributária.

Sobre o IVA Dual, a ideia inicial era unificar PIS, Cofins, ISS. No entanto, a ideia não avançou por ferir o pacto federativo.

Com isso, surgiu a alternativa de criar o CBS (para tributação federal) e o IBS (para tributação municipal e estadual).

O advogado e mestrando em Direito Tributário, Luiz Fernando Sachet, alertou para um risco que o Imposto Seletivo oferece, de não ser estabelecido por lei, mas sim pela determinação do governo federal, que pode aumentar ou diminuir alíquotas com simples decretos, o que pode causar insegurança jurídica e aumentar a carga tributária de diversos setores. Isso porque, dependendo de como esse imposto seletivo for tributado, ele pode atingir desde combustíveis até telecomunicações, dois elementos centrais para a indústria.

Destino da arrecadação

Uma das grandes queixas de gestores municipais é a destinação dos recursos previstas na reversão da arrecadação de destinos, algo que a Reforma Tributária promete modificar.

César Dias explica que essa situação vai requerer muito cuidado, porque uma vez que o ICMS e o Cofins forem unificados, isso será um desafio para distribuir o destino do recurso se dois municípios tiverem duas alíquotas diferentes de destinação final.

“Imaginem, por exemplo, se a alíquota de Manaus for 5 e a de Manacapuru for 2. Agora imaginem mais de 5 mil municípios”, alertou.

Luiz Fernando Sachet reclamou da falta de base para a simulação de alíquotas projetadas para IBS e CBS, que estavam prevista inicialmente em 27% e 9,05%, respectivamente.

O problema é que essa estimativa é inicial, antes da tramitação no Congresso, onde ela pode aumentar ainda mais.

“Ainda há muita indefinição de quanto será essa alíquota”, lamentou.

Um outro ponto a ser observado é a possibilidade de crédito para compensar o impacto das alíquotas de IBS e CBS sobre a folha de pagamento.

Embora o argumento seja que ele será pequeno devido justamente a esse crédito, o jurista afirma que a consequência disso é o aumento da terceirização dos serviços, especialmente na Zona Franca de Manaus, justamente por conta do acesso a esse crédito.

“Os estados ao conceder incentivos fiscais, pedem contrapartidas em forma de fundos. Só que esses incentivos compõem os orçamentos dos estados. Se houver queda na arrecadação dessas contrapartidas, os orçamentos dos estados vão cair”, lembrou William Barros Cunha, do Departamento de Tributação da Secretaria de Fazenda do Amazonas (Sefaz-AM), também presente ao evento.

Fundo de Sustentabilidade do Amazonas

Também foi explicado como deverá funcionar o chamado Fundo de Sustentabilidade do Amazonas, mecanismo utilizado para compensar as perdas com o fim do IPI.

Esse fundo tem como objetivo fomentar o desenvolvimento e a diversificação das atividades econômicas do estado e que será instituído por meio de Lei Complementar e constituído com recursos da União.

O problema, segundo Sachet, é a falta de informação sobre como esses fundos serão definidos.

“Ela está definida pela Reforma Tributária, mas seus detalhes não estarão na Constituição”, afirma.

A falta de detalhes sobre esse fundo torna difícil saber se a sua aplicação fará o Amazonas ganhar ou perder receita.

“Esse fundo está condicionado a renúncias do próprio estado”, lamentou.

O advogado afirma que os estados estão apoiando a Reforma Tributária mesmo que ela retire a arrecadação com o ICMS porque acreditam que esses fundos criados para desenvolvimento vão compensar.

Pontos de atenção

 Ao final da palestra, os juristas listaram os principais pontos de atenção para a reta final de tramitação da Reforma.

Dentre eles estão o aumento da carga tributária para o setor de serviços e da terceirização, além da possível redução de produtos que compõem a cesta básica (em virtude do imposto seletivo).

Também deverá crescer a complexidade do Simples Nacional em virtude do período de transição da Reforma.

“Em princípio, a ideia é simplificar de cinco tributos para dois, mas até 2032 serão sete. Por algum tempo, outros tributos vão conviver entre si”, avalia Sachet.

Por último, os advogados alertam para o risco ao direito de manutenção do crédito decorrente das entradas de bens e serviços na ZFM, pois a isenção e não incidência não durarão direito ao crédito.

“E ainda há o risco de que o período de transição desses tributos seja prorrogado”, afirma.

Outro elemento importante é a criação do Conselho Federativo, que será criado para gerenciar os recursos de estados e municípios.

“A partir da Reforma, os recursos arrecadados não irão diretamente para os estados, mas para este conselho. Ele irá definir o destino desse dinheiro”, explica Sachet.

Tranquilidade

Apesar dos alertas dos advogados, o representante da Secretaria de Fazenda do Amazonas, William Barros Cunha, passou uma mensagem de tranquilidade e otimismo aos representantes da indústria presentes ao evento.

Cunha garantiu que o governo do estado estará atento aos movimentos do Congresso.

“A ideia é fazer com que a nossa arrecadação permaneça como está”, conluiu.

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