Agenda Amazônia: a pauta em partilha

Sentar para conversar, quando o assunto é futuro, supõe sempre ouvidos atentos, braços abertos e mãos estendidas. Na listagem sugestiva da Agenda Amazônia, já listamos alguns dos embaraços de nosso relacionamento com a União, que fez do Amazonas um exportador líquido de recursos. As verbas constitucionalmente destinadas à redução das desigualdades regionais – ironicamente – são aplicadas em regiões do país mais aquinhoadas com infraestrutura de desenvolvimento. E somente em Manaus, a União recolhe 50% dos impostos federais do Norte.

 

E no âmbito estadual, além de promover a movimentação de 85% do ICMS, o acerto desta contrapartida fiscal aparece nos recursos recolhidos ao poder público do Amazonas – mais de R$ 1,4 bilhão/ano – que pagam integralmente a UEA (Universidade do Estado do Amazonas), presente em todos os 62 municípios, custeio do Centro de Educação Tecnológica, com mais de 500 mil pessoas treinadas, e financia as cadeias produtivas do interior e os programas de turismo e interiorização do desenvolvimento. Somados os recursos do FTI e FMPES, é mais de um bilhão de reais destinados a interiorização do desenvolvimento. Tudo como manda a lei.

 

Entretanto, até bem pouco tempo, com exceção da Afeam, essa dinheirama esteve sendo usada no custeio da máquina pública, ou para suprir investimentos da ausência federal. Como reverter essa disfunção de propósitos? Qual o papel da representação parlamentar no encaminhamento desta questão.

 

Zona de livre(?) comércio

 

A Constituição do Brasil nos confere a condição de Zona de Livre Comércio. Entretanto, os fiscais do Ministério da Fazenda trataram de descaracterizar este direito. A fiscalização da entrada de mercadorias em Manaus, além de inconstitucional, é a mais rigorosa do Brasil, e as greves dos servidores da auditoria costumam radicalizar em momentos pontuais do mercado, em que poderíamos recuperar a perda de receita. E nesse contexto de maus tratos podemos listar alguns abusos. Em alguns portos do país sobram fiscais do Ministério da Agricultura. Os acúmulos de mercadorias retidas por conta disso são um absurdo inaceitável.

 

Temos restrições de toda ordem, fruto do ambientalismo fundamentalista ou apenas da inépcia burocrática que em lugar de proibir poderia estimula os acertos de quem quer fazer e gerar riqueza com inteligência. Nossos rios não têm balizamento, nossa logística de transportes é precária, como é precária a distribuição de energia, e a comunicação de dados e voz a mais cara e lenta do Brasil.

 

Nossas contribuições

 

Em vez de reconhecimento somos castigados por nossa contribuição fiscal. Aqui temos 8 mil quilômetros de fronteira para cuidar. Não podemos ficar a mercê do crime e da violência da droga. Não podemos aceitar que o Amazonas seja visto como parte do problema nacional e sim como começo e base das soluções que temos a ofertar. São oportunidades perdidas, benefícios suprimidos para essa juventude que sucumbe ao tráfico, com nossas famílias ameaçadas pela violência. Somos especialistas em proteger florestas, mas queremos nossos recursos para fazer uma economia pujante com a diversidade de tantos recursos para transforma o caos em alternativas de superação e construção da prosperidade geral.

 

Não ao “nós contra eles”

 

Além de prestar contas do que fazemos na contrapartida fiscal – milhões de empregos, proteção florestal e serviços ambientais – a economia do Amazonas pretende desconstruir essa oportunista dicotomia do “nós contra eles”. Trata-se de artimanha perversa que camufla interesses e mascara os reais problemas do Brasil atrasado, burocrático e cartorial. É enganoso, nesse conceito achar que o mundo se divide entre esquerda e direita, onde direita são os empresários e esquerda são os arautos das demandas sociais. Acreditamos, com efeito, que o melhor território para iniciar a insensatez dessa separação seja o Congresso Nacional.

 

E o que, decididamente, importa? Em vez de nutrir esse conflito obtuso entre Norte-Nordeste de um lado e o resto do Brasil em berço esplêndido, precisamos costurar aproximações construtivas e produtivas. Muita conversa em torno da integração espalha o bem em todas as direções. Afinal, temos recursos humanos e naturais de primeira grandeza e o talento não depende de configurações regionais, étnicas ou culturais. Temos fibras, humanas, vegetais, e no Brasil a biodiversidade precisa mobilizar a diversidade humana e de talentos, de olho na geodiversidade, para virar prosperidade com padrões de sustentabilidade.

 

Em vez do confronto, a parceria

 

Precisamos, urgentemente, investir na ampliação das parcerias, prioritariamente locais e decididamente nacionais. Novos atores precisam engrossar a revoada das andorinhas. Só em bloco e em estado de coesão cívica conseguiremos assegurar o verão de um novo sol. Quem tem projetos em andamento ou gestação na academia, quem é capaz de formular projetos para diversificar, adensar e interiorizar a academia e quando vamos, em mutirão, com transparência e ousadia, exigir que os recursos aqui gerados sejam aplicados conforme os expedientes legais que estabelecem os critérios obrigatórios de aplicação.

 

Aprimorar nossa comunicação

 

As matérias jornalísticas que demonizam os 8% de incentivos fiscais da Amazônia Ocidental ignoram mais de 2 milhões de empregos que geramos, os serviços ambientais que oferecemos, em manter uma floresta quase intacta no Amazonas. Precisamos nos apresentar e dizer que se o Brasil não confiscasse 80% dos recursos para P&D aqui gerados para outros fins, alguns obscuros, já teríamos diversificado a indústria local, adensado seu valor com inovação tecnológica e promovido uma revolução tecnológica e um patamar de prosperidade como fez Cingapura. Isso supõe um debate nacional e um acordo político apartidário.

 

Conjugando o protagonismo

 

Para mobilizar novos atores nessa movimentação global, nacional e local que separa economia e política, e propicia o reconhecimento de quem produz, e sua autoridade em exigir a transparente aplicação da riqueza produzida, precisamos conjugar o verbo protagonizar, uma variante gramatical e crucial do verbo empreender, fazer acontecer. Podemos e temos que contrapor os fatos e formular acordos de ações inteligentes, partilhadas e produtivas.

 

Para quem nos acusa de enclave fiscal, e responsabilidade pelo rombo das contas públicas, queremos propor esclarecimentos baseados em fatos. Não há renúncia fiscal. Somos o Estado que mais recolhe imposto em todo Norte e Nordeste apesar de ter apenas 0.6 % das indústrias do Brasil, 30% estão em São Paulo. Temos apenas uma grande bioindústria de fármacos em Manaus, no coração da floresta, que demorou 5 anos esperando uma maldita licença chamada PPB, que autoriza o processo básico de produção de determinados produtos.

 

O amparo da lei

 

A Constituição impede que apenas 5 produtos tenham incentivos fiscais: automóveis de passeio, perfumes, armas de fogo, bebidas alcoólicas e cigarros. Mesmo assim, desde que foi criado esse ‘licenciamento’ anti-constitucional – o PPB – o embargo de gaveta impede que as empresas possam livremente empreender na região. Atualmente, 92% da isenção fiscal está fora da Amazônia Ocidental. Mais da metade da renúncia fiscal é usada onde não se aplica o preceito constitucional da redução das desigualdades regionais.

 

Precisamos conversar mais amiúde em cima da realidade, formular coalizões de brasilidade. A economia do Amazonas é isenta de alguns impostos, porque a logística dos transportes é precária, cara e duopolizada. Aqui se fabrica a energia limpa e barata das hidrelétricas da Amazônia. Isso é aproveitado pelas grandes empresas e pelas populações do Sudeste, e aqui fica a distribuição sucateada e as tarifas mais caras.

 

Conversa ao pé do ouvido

 

Com essa infraestrutura não há competitividade. E considerem que recolhemos aproximadamente R$ 100 bilhões para os cofres federais nos últimos 10 anos e recebemos menos de R$ 25 bilhões. Segundo dados obtidos pelo pesquisador Jorge de Souza Bispo, autor da tese Criação e Distribuição de riqueza pela Zona Franca de Manaus, de toda a riqueza produzida por indústrias da ZFM, 54,42% vão para o governo, 27,28% são distribuídas entre os empregados e apenas 1,82% ficam com os proprietários das empresas. Em compensação, no restante do País o governo recebe 41,54% de toda a riqueza produzida, os empregados ficam com 36,31% e os empresários com 6,44%.

 

Convite cívico de um Brasil Amazônia

 

Temos outros benefícios prestados a elencar, paradoxos para entender e desafios para enfrentar. Isso implica em trabalho, racionalidade e compromisso, as marcas de nossa atuação e habilidades. Convidaremos juntos o Brasil para passear na floresta, com 95% de proteção assegurada pela economia vigente no Amazonas, sem lobos nem fantasia, e sim com um acervo monumental de recursos naturais e acertos fiscais, carente de infraestrutura e pátria desejada por pesquisadores e investidores da economia sustentável. Assim, nos inserimos no sumário nacional para escrever e publicar a história de um país mais próspero e solidário.

 

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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected]

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