Ferrogrão avança no Pará enquanto o Amazonas fica sem nada no Arco Norte

Trecho da Ferrovia Norte-Sul. Foto: Marcos Sandes

O atual PNLT, que vai até 2035, praticamente mantém mais do mesmo: nada para o Amazonas e uso de infraestrutura para o Norte apenas para escoamento de produtos do Centro-oeste

Que existe uma disputa entre os dois maiores estados do Norte do Brasil em questões regionais é fato e até salutar para manter a competitividade, mas quando se trata de logística o Amazonas fica sempre para trás e mantém o isolamento do resto do país, enquanto o estado vizinho Pará avança com a construção da Ferrogrão e do Arco Norte. A PIM Amazônia entrevistou especialistas em logística de transporte para esclarecer por que a rodovia BR-319, mesmo fazendo parte do Plano Nacional de Logística e Transportes (PNLT), continua com dificuldade em concluir o “Trecho do Meio” e carece de manutenção em toda a sua extensão.

De acordo com Augusto César Barreto Rocha, doutor em Engenharia de Transportes (COPPE/UFRJ), na questão do Arco Norte, tem faltado continuidade dos projetos e alocação orçamentária efetiva para a mudança do déficit histórico. “Já houve época em que a diretriz era não investir nada no Arco Norte, por “baixa ou nenhuma perspectiva de crescimento”. O atual PNLT, que vai até 2035, praticamente mantém mais do mesmo: nada para o Amazonas e uso de infraestrutura para o Norte apenas para escoamento de produtos do Centro-oeste. Não há uma efetiva ideia de expansão da capacidade de infraestrutura do Amazonas. Quanto ao Pará, a Ferrogrão, é um conjunto de estratégias para atender às atividades econômicas já existentes, sem o uso da infraestrutura como orientação ao desenvolvimento, como preconiza a moderna teoria de transportes. No que diz respeito à BR-319, o projeto, segundo o PNLT, poderia ser importante integração com a BR-364, podendo ajudar”, esclarece.

Questionado sobre a participação da Fieam em debates na mesma intensidade que a Fiepa, Rocha ratifica que o Amazonas continua sendo ignorado. “Muito pouco. De maneira geral, a Fieam não tem sido integrada no debate, salvo nos momentos em que exigimos a participação, como no projeto de Microeixos (Sudam), quando foi necessário um posicionamento contrário do projeto realizado, até que a infraestrutura do Amazonas fosse considerada. O Amazonas continua sendo ignorado no que diz respeito aos projetos de infraestrutura, o que é um grande problema para todos nós”, lamenta.

Já o futuro da BR-319 continua incerto e depende do esforço conjunto para sair do papel e avançar nas questões ambientais. Rodovia que liga Manaus (AM) a Porto Velho (RO) está, há mais de 30 anos, com problemas que dificultam ou até impedem o tráfego. A área mais crítica segue do quilômetro 250 ao 655, o chamado \”trecho do meio\”. “A perspectiva segue sendo de incerteza. Há um possível futuro de execução, mas nos preocupa sobremaneira a ausência de perspectivas claras para as questões ambientais associadas. O grande desafio que se coloca são dois: garantir uma rodovia e garantir a sustentabilidade e proteção da floresta. Continuamos com um debate pendular: nada fazer ou fazer ignorando a proteção da floresta. Ambas as soluções não interessam, pelas consequências danosas nos dois casos”, alerta Rocha.

Ferrogrão no Pará

Por outro lado, a implantação da Ferrogrão potencializa o desenvolvimento econômico do Pará e o investimento em novas ferrovias no Acre garante o fortalecimento da rede logística brasileira. Para se ter ideia, a ampliação da malha ferroviária no Estado do Pará é considerada primordial para consolidar o desenvolvimento econômico local, potencializando os setores logístico e industrial. Um dos projetos mais importantes previstos é a construção da Ferrogrão, que garantirá a competitividade e o impulsionamento da exportação de grãos, utilizando o Pará como rota estratégica, além de ampliar o potencial de escoamento de outras cargas (minérios, celulose, produtos siderúrgicos, cimento, containers, etc.) pelo complexo logístico do Estado.

De acordo com a vice-presidente de operações da Hidrovias do Brasil, Gleize Gealh, o investimento em novas ferrovias no Estado garante o fortalecimento da rede logística brasileira. “Em relação ao Pará, verificamos que entre os projetos que hoje se desenham no cenário nacional, a Ferrogrão, que ligará o trecho entre o município de Sinop, no Mato Grosso, e Miritituba, no Pará, é um dos mais importantes para fortalecer a cadeia logística da região e manter o Estado como um dos protagonistas do cenário nacional”, destaca.

Segundo Gleize, no último levantamento realizado em 2020, os terminais portuários paraenses escoaram cerca de 37% das exportações de soja e milho do Mato Grosso, equivalente a 16 milhões de toneladas. Para os próximos anos, existe uma tendência de crescimento na produção e exportação de soja e milho do Mato Grosso, com projeções que indicam quase 83 milhões de toneladas até 2030. “Conforme estudos técnicos, em um cenário com a implantação da Ferrogrão, o Pará se tornaria ainda mais protagonista e poderia chegar a ser responsável por 40% das exportações realizadas pelo Mato Grosso, o que equivaleria a 34 milhões de toneladas transportadas, mais do que o dobro do que é transportado hoje”, avalia.

Gleize reintera que o projeto é fundamental para tornar o Pará como referência no mercado de exportação de grãos e outras cargas, uma vez que a ferrovia trará mais competitividade em termos de custos logísticos e proporcionará aos produtores uma rota ainda mais eficiente, garantindo maior destaque no mercado internacional.

Entraves

No entanto, há entraves que dificultam a viabilidade do projeto que envolvem principalmente a esfera regulatória, que está relacionada ao processo que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF), sob condução do ministro Alexandre de Moraes, que aguarda uma decisão para o prosseguimento normal da ação. 

Glaise informa que para garantir a celeridade na resolução dessas pendências jurídicas, entidades e empresas dos setores industriais e logísticos vem fomentando debates e propondo soluções para assegurar investimentos futuros na ampliação da malha ferroviária no Estado.

“Nosso foco tem sido trazer os vários interessados no projeto da Ferrogrão para um debate isento e técnico que defenda este modal como a solução mais competitiva para o Arco Norte e, atendendo aos anseios da sociedade, provar que é um projeto ambientalmente amigável e socialmente responsável, conciliando a competitividade do Arco Norte com os requisitos socioambientais que o mercado e a sociedade exigirão cada vez mais”, ressaltou a representante da Hidrovias do Brasil.

Além do segmento logístico, o setor industrial, representado pela Federação das Indústrias do Estado do Pará (FIEPA), também vem somando esforços para pleitear a viabilidade da Ferrogrão, que é vista como estratégica para a expansão da economia do Estado. “A Fiepa tem incentivado o debate em vários fóruns, para ganhar apoio de outras entidades e da sociedade, que serão beneficiadas pela construção da ferrovia. Juntamente com a Associação Comercial do Pará (ACP), Federação das Associações Comerciais e Empresariais do Pará (Faciapa), Federação da Agricultura e Pecuária do Pará (Faepa), Sindicato da Indústria da Construção do Estado do Pará (Sinduscon) e Centro das Indústrias do Pará (CIP), a Fiepa protocolou em março uma petição junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), na condição de amicus curiae, com o objetivo de garantir que órgãos, entidades e especialistas possam participar das discussões, argumentar e contribuir com a solução jurídica a ser definida pela corte”, ressalta José Conrado Santos, presidente da Fiepa.

Santos ainda ressalta que a Ferrogrão é importante não só para o setor industrial, mas para o setor primário e para a sociedade como um todo, pelo desenvolvimento econômico e pelos empregos que ela vai gerar. “Os principais benefícios estão relacionados ao uso de um corredor logístico que precisa ser melhor aproveitado e, ainda, a redução em mais de 50% do custo do frete interno, esse é um dos maiores gargalos de quem produz na Região Norte, devido à nossa localização. A viabilização da ferrovia torna o produto paraense mais competitivo no mercado externo”, enfatizou.

Sobre a Hidrovias do Brasil

A Hidrovias do Brasil é uma empresa de logística integrada com foco no aproveitamento do transporte hidroviário, em toda a América do Sul. No Corredor Logístico Norte (Miritituba-Barcarena, Pará), a empresa oferece uma alternativa logística para o transporte e escoamento de grãos da região Centro-Oeste do Brasil, além da operação de cabotagem para transporte de minérios. Para estas operações, foram investidos R$ 2,2 bilhões na região, que tem capacidade de movimentar cerca de 7 milhões de toneladas de grãos por ano.

No Corredor Logístico Sul, a empresa opera por meio da Hidrovia Paraguai-Paraná, onde movimenta cargas diversas, como commodities agrícolas, minérios, fertilizantes, celulose, entre outras. A Hidrovias do Brasil foi fundada em 2010 e em 2020 fez o seu IPO, passando a ser listada no segmento do Novo Mercado da B3, demonstrando o seu elevado padrão de governança corporativa.

Os principais benefícios estão relacionados ao uso de um corredor logístico que precisa ser melhor aproveitado e, ainda, a redução em mais de 50% do custo do frete interno, esse é um dos maiores gargalos de quem produz na Região Norte.

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