“Futuro da ZFM exige imediata desburocratização das regras do jogo”

SEGURANÇA JURÍDICA, CONDIÇÕES LOGÍSTICAS E SIMPLIFICAÇÃO TRIBUTÁRIA SÃO PONTOS CONSIDERADOS FUNDAMENTAIS PARA O INVESTIDOR APOSTAR NA IMPLANTAÇÃO DE UMA LINHA DE PRODUÇÃO NO PARQUE FABRIL DA ZONA FRANCA DE MANAUS (ZFM). O EX-COORDENADOR JURÍDICO DA SUPERINTENDÊNCIA DA ZONA FRANCA DE MANAUS (SUFRAMA), advogado e sócio-proprietário do escritório Almeida & Barretto, Eduardo Bonates Lima, avalia que esse modelo de desenvolvimento regional continua sendo economicamente atrativo, mas adverte que o empresário precisa se sentir seguro para implantar seu negócio na região. Nesta entrevista exclusiva concedida à Revista PIM Amazônia, Bonates fala também sobre os problemas trazidos pela guerra fiscal e as incertezas em torno da sucessão política. O entrevistado destaca que o futuro da ZFM depende de uma bancada do Amazonas forte no Congresso Nacional, levando em conta que o polo incentivado de Manaus é um assunto de interesse nacional. Confira, a seguir, a íntegra da entrevista.

PIM Amazônia – Diante de sua experiência como ex-coordenador jurídico da Suframa e considerando os Processos Produtivos Básicos (PPBs), que são as condições definidas para a empresa produzir com incentivos. De que forma está sendo tratada essa questão hoje entre a Suframa e o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços(Mdic)?

Eduardo Bonates – Na verdade, desde 2010 a Suframa participa do Grupo Técnico Interministerial de Análise de Processos Produtivos Básicos, juntamente com o Mdic e o Ministério de Ciência e Tecnologia [MC&T]. Infelizmente, numa disputa com dois ministérios, é óbvio que a Suframa será o elo fraco dessa equação, de modo que o Processo Produtivo Básico ainda é o maior entrave das empresas instaladas ou que pretendem se instalar na Zona Franca de Manaus. Num mundo que acelera a 200 quilômetros por hora, a fixação ou alteração dos PPBs ainda galopa no ritmo de um cavalo manco, frente aos atuais entraves legais e burocráticos. Mas não se pode colocar a culpa nos ombros da Suframa: afinal, essa é uma questão da alçada do Congresso Nacional. O caso exigiria, na verdade, uma concentração de esforços entre a bancada do Amazonas e entidades de classe para tentar modificar a legislação e permitir uma maior atuação da Suframa na questão dos PPBs.

O que deve ser feito para manter as vantagens competitivas que o modelo Zona Franca tem hoje? Há alguma forma de recuperar o que foi perdido desde sua criação, em 1967?

EB: Essa é uma pergunta fácil de responder. Basta comparecer na próxima reunião da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas [Fieam], do Centro da Indústria do Estado do Amazonas [Cieam], da Câmara de Dirigentes Lojistas de Manaus [CDL-Manaus], da Associação Comercial do Amazonas [ACA], que os empresários terão a resposta na ponta da língua. Todos aqueles que se aventuram a produzir na Zona Franca de Manaus não querem mais do que segurança jurídica, condições logísticas e simplificação tributária. Não precisa se inventar a roda, basta permitir que os empresários tenham condições de tocar seu negócio da forma mais livre e segura possível. O problema é que, entra ano e sai ano, os problemas governamentais e o verdadeiro inferno burocrático estão aí para atrapalhar o modelo.

No que se refere à Guerra Fiscal, como o senhor avalia essa briga entre os governos estaduais para conquistar mais investimentos para suas regiões, principalmente entre São Paulo e o Amazonas?

EB: Eu sempre digo que ninguém pode ir para a guerra sem antes fazer o dever de casa. Não podemos acusar São Paulo de nos prejudicar se o próprio Governo do Amazonas, ao longo dos últimos anos, tomou diversas medidas com relação ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços [ICMS] que abalaram a confiança e a finança dos investidores. Minha sugestão é que o próximo governador se reúna com as entidades de classe da indústria e do comércio e, de uma vez por todas, entenda o que é necessário para se manter ou aumentar investimentos. A partir daí, então, mais uma vez será preciso se valer de uma bancada do Amazonas forte e atuante no Congresso Nacional para barrar qualquer tentativa de lei que prejudique o modelo. E, caso não tenhamos força na Câmara e no Senado, nos resta o Supremo Tribunal Federal (STF), que vem resguardando a Zona Franca de Manaus nas últimas décadas e mantendo seu diferencial competitivo.

Ainda não temos um quadro político definido com relação à governança do Amazonas e do Brasil a partir de 2019. Como o senhor vê essa questão? É preocupante do ponto de vista dos investimentos para a nossa região?

EB: A eleição por si só gera cautela e paralisação nos investimentos. Acredito que a questão nacional – com modelos econômicos extremamente antagônicos – seja muito mais importante nesse momento do que a disputa local para governador do Amazonas. Nunca é demais lembrarmos que o modelo ZFM é essencialmente um assunto federal. O que vejo e escuto no PIM e no comércio varejista é um misto de expectativa e apreensão, o que obviamente gera congelamento de investimentos. E, sim, não podemos negar: muitos empresários aguardam essa definição nacional das eleições para decidir o futuro. Outubro será, então, um mês de espera, o que nunca é bom.

Como o senhor avalia o futuro da Zona Franca de Manaus diante das mudanças que se avizinham no horizonte?

EB: O futuro do modelo ZFM exige uma imediata desburocratização das regras do jogo e que as principais operadoras do modelo – como a Suframa, ou as secretarias estaduais da Fazenda [Sefaz] e do Planejamento [Seplan] – desenvolvam mecanismos simples e céleres em prol das empresas. Ou a Suframa e o governo do Amazonas entendem de uma vez por todas que é necessário atender ao empresariado – e não o contrário –, ou aqueles que buscam lucratividade a qualquer custo optarão por abandonar o modelo. Sim, sou daqueles que acreditam que o problema está aqui, bem ao lado, tem nome e sobrenome e atua impunemente, afugentando o empresário. Não se atrai grandes players mundiais com burocratas e carimbadores de documentos. É preciso, antes de tudo, inverter a atual lógica e colocar os empresários – e não os burocratas – como fomentadores do desenvolvimento. Escutem os empresários e o caminho para o futuro será muito mais tranquilo.

O Mdic deve lançar consulta pública referente à nova regulamentação que substituirá o Decreto nº 6.008/2006, que trata do benefício fiscal para empresas produtoras de bens de informática na ZFM que investirem em pesquisa e desenvolvimento na Amazônia. A explicação é que a consulta pública intensifica o processo de regulamentação do setor, com os normativos necessários para que a ZFM tenha legislação mais sofisticada em termos de investimentos em PD&I. Como o senhor avalia a questão?

EB: Com extrema preocupação. O governo Temer já demonstrou que não tem lá muita preocupação e cuidado com a Zona Franca de Manaus e esse tipo de consulta no fim de um mandato presidencial me assusta. A simples canetada de um presidente da República pode alterar substancialmente as regras do jogo e gerar absurda insegurança jurídica.  A não ser que o presidente ouça as entidades envolvidas com a ZFM, o que é muito improvável, é possível que surja um Decreto Presidencial, com clima de fim de festa, que ignore todas as discussões e jogue uma bomba em nossos colos.

O senhor preside a Comissão da Zona Franca da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Amazonas (OAB/AM). Que assuntos são trabalhados por lá e de que forma são encaminhados?

EB: Quando assumimos a comissão, no mandato do presidente Choy, tivemos como compromisso uma forte defesa dos interesses do modelo Zona Franca de Manaus. Nosso objetivo último sempre foi criar condições de manutenção de empresas aqui instaladas, o que obviamente gera emprego e renda, com consequente desenvolvimento de nossa economia e melhoria dos indicadores socioeconômicos. Nesse último triênio, então, tivemos essa verve reativa, vigilante. De modo que, sempre que uma ameaça se avizinhava, já pensávamos numa solução jurídica e concreta para o caso. No caso recente do Polo de Concentrados, por exemplo, apresentamos a medida judicial cabível para estancar a sangria provocada pelo Decreto Presidencial.

Que outras atividades o senhor desenvolve atualmente?

EB: Por certo, gostaria de me voltar mais para as questões institucionais da Zona Franca de Manaus. Mas, minha atuação na advocacia ainda não me permite. A demanda constante pela redução de custos tributários por parte dos empresários, nossa busca incessante de teses e meios judiciais de suspensão e exclusão de tributos que não respeitam a Zona Franca de Manaus e nossa atuação nas quatro esferas do Poder Judiciário (temos centenas de processos em andamento na Justiça Federal de Primeira Instância, Tribunal Regional Federal, STJ e STF) acabam ocupando um tempo considerável em nosso dia a dia. O amor pela advocacia, pela satisfação do cliente em economizar milhões de reais evitando tributos indevidos, poder ajudar empresas a salvar empregos, tudo isso é o que mais me motiva. Mas, isso tem um preço. Eesse preço é não estar tão presente como gostaria nas discussões institucionais sobre a Zona Franca de Manaus.

Por Margarida Galvão

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