Bitcoin, moeda digital mais importante do mundo, acumula desvalorização de cerca de 60% este ano.
Para Jeremy Fong, a financeira norte-americana de criptomoedas Celsius era o lugar ideal para acumular suas participações em moeda digital e ganhar algum dinheiro com suas taxas de juros de dois dígitos.
“Eu estava provavelmente ganhando US$ 100 por semana” em sites como Celsius, disse Fong, que trabalha no setor aeroespacial e vive em Derby, na Inglaterra. “Isso cobria as minhas compras de mercado.”
Agora, porém, os ativos digitais de Fong, que formam um quarto de sua carteira, estão presos na Celsius, após a financeira de criptomoedas congelar saques de seus 1,7 milhão de clientes na semana passada, citando condições “extremas” de mercado. A proibição dos saques estimulou uma liquidação que eliminou centenas de bilhões de dólares do valor das criptomoedas em todo o mundo.
As participações em criptomoedas de longo prazo de Fong caíram cerca de 30%. “Definitivamente estou em uma posição muito desconfortável”, disse ele à Reuters. “Meu primeiro instinto é apenas sacar tudo” da Celsius, disse ele.
A implosão da Celsius ocorreu após o colapso de dois outros ativos digitais importantes no mês passado que abalou um setor de criptomoedas já sob pressão, à medida que a inflação crescente e as taxas de juros em elevação provocaram uma fuga de ações e outros ativos de maior risco.
O bitcoin caiu abaixo de US$ 20 mil em 18 de junho pela primeira vez desde dezembro de 2020. A moeda digital mais importante do mundo acumula desvalorização de cerca de 60% este ano. O mercado geral de criptomoedas caiu para cerca de US$ 900 bilhões, abaixo do recorde de 3 trilhões atingido em novembro.
O colapso das criptomoedas deixou investidores individuais em todo o mundo feridos e confusos. Muitos estão com raiva da Celsius. Outros juram nunca mais investir em moedas digitais. Alguns, como Fong, querem uma supervisão mais forte sobre o setor.
Susannah Streeter, analista da Hargreaves Lansdown, comparou a turbulência ao colapso das ações “pontocom” no início dos anos 2000 – com tecnologia e capital de baixo custo facilitando o acesso de investidores individuais às criptomoedas.
“Temos essa colisão de tecnologia de smartphones, aplicativos de negociação, dinheiro barato e um ativo altamente especulativo”, disse ela. “É por isso que você viu uma ascensão e queda meteóricas.”
“Andando no escuro às 2 da manhã”
Bancos de criptomoedas, como o Celsius, oferecem altas taxas de juros para investidores – principalmente indivíduos – que depositam suas moedas nesses sites. Essas empresas, em sua maioria não regulamentadas, investem então no mercado de criptomoedas no atacado.
O congelamento de saques promovido pela Celsius foi semelhante a um pequeno banco fechando suas portas. Mas um banco tradicional, supervisionado por reguladores, teria alguma forma de proteção para os clientes.
Um dos afetados pela suspensão dos saques da Celsius foi Alisha Gee, 38, que investiu “até o último centavo” de seu salário em criptomoedas desde 2018, que se acumularam em uma soma de cinco dígitos.
Ela tem US$ 30 mil em depósitos na Celsius – parte de sua carteira geral em criptomoedas – ganhando juros de US$ 40 a 100 por semana, o que ela esperava que a ajudasse a pagar a hipoteca.
Há pouco mais de uma semana, Gee recebeu um email da Celsius dizendo que ela não poderia fazer mais saques. “Eu me peguei andando no escuro às 2 da manhã, apenas para frente e para trás”, disse ela.
“Eu acreditei na empresa”, disse Gee. “Não é bom perder US$ 30 mil, especialmente porque eu poderia pagar a minha hipoteca.”
O presidente-executivo da Celsius, Alex Mashinsky, escreveu no Twitter em 15 de junho que a empresa estava “trabalhando sem parar”, mas deu poucos detalhes sobre como ou quando os clientes poderiam acessar seus recursos. Na segunda-feira, a empresa afirmou que tinha como objetivo “estabilizar nossa liquidez e operações.”
Opostos
Para alguns, o entusiasmo pelas criptomoedas não diminuiu. “Eu já vi múltiplos ciclos de mercado baixista até agora, então estou evitando qualquer reação brusca”, disse Sumnesh Salodkar, 23 anos, morador da cidade indiana de Mumbai cuja carteira de criptomoedas acumulou perdas, mas ainda está em território positivo.
Para outros, os avisos de reguladores de todo o mundo sobre os riscos de se envolver em criptomoedas se tornaram realidade.
Halil Ibrahim Gocer, jovem de 21 anos na capital turca Ancara, afirmou que os investimentos de US$ 5 mil em criptomoedas de seu pai agora estão em US$ 600 desde que ele o apresentou ao mercado.
Reguladores em países ao redor do mundo estão trabalhando em como construir proteções de criptomoedas que possam proteger os investidores e diminuir os riscos para uma estabilidade financeira mais ampla.
“Conhecimento pode te levar apenas até certo ponto em criptomoedas”, disse Gocer. “Sorte é o que importa.”
Outro investidor, um trabalhador do setor de tecnologia da informação em Mumbai, afirmou que investiu 75% de suas economias, várias centenas de dólares, em criptomoedas. O valor despencou cerca de 70% a 80%.
“Isso vai ser meu último investimento em criptomoedas”, disse ele, pedindo para não ser identificado.
Reguladores em países ao redor do mundo têm trabalhado na construção de proteções aos investidores e redução de riscos à estabilidade do sistema financeiro mais amplo.
A turbulência no mercado de criptomoedas provocada pela Celsius destacou a “necessidade urgente” de regulação para as criptomoedas, disse um funcionário do Tesouro dos Estados Unidos na semana passada.
Fong, o investidor britânico que perdeu acesso ao seu dinheiro na Celsius, quer mudanças.
“Um pouco de regulação seria bom. Mas creio que trata-se de equilíbrio”, afirmou. “Se você não quiser muita regulação, é isso que você recebe”, disse Fong.
Fonte: Reuters
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