“Pior Congresso?”: especialistas levantam defeitos e qualidades do Legislativo desde a redemocratização

Atacado por Lula e defendido por Lira e Pacheco, atuação do Congresso Nacional divide opiniões entre cientistas políticos e parlamentares com décadas de mandato.

Presidente da Câmara por três períodos e comandante da Assembleia Nacional Constituinte, o deputado Ulysses Guimarães (PMDB-SP) dizia que a legislatura seguinte era sempre pior. Quase 30 anos após a morte do “Dr. Diretas”, a crítica à atuação do Congresso esquenta as discussões na pré-campanha eleitoral.

Em ataques recentes ao Congresso, Lula emula Ulysses, mas crava a atual composição como a “pior da história”. “Com minha experiência de 50 anos de vida política, o Congresso nunca esteve tão deformado como agora, nunca esteve tão antipovo. É o pior Congresso que já tivemos na história”, afirmou o petista em março. Os comandantes do Senado e da Câmara saíram em defesa do Legislativo.

O presidente do Senado e do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), respondeu que a fala de Lula era “deformada, ofensiva e sem fundamento” e a classificou como “fruto do início da disputa eleitoral que faz com que seja ‘interessante’ falar mal do Parlamento”. Já o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), chamou o petista de “grosseiro” e “desinformado”. “Lula vem cometendo atos falhos o tempo todo, não é só comigo”, disse.

Lula, Pacheco e Lira foram procurados pela reportagem, mas não se manifestaram.

Para discutir a qualidade, os acertos e disfunções do Congresso — de hoje e ao longo da história —, a reportagem procurou cientistas políticos, especialistas na atividade legislativa e parlamentares longevos, que vivenciaram diferentes períodos da história dentro da Câmara e do Senado.

Esses profissionais basearam suas análises em critérios plurais, que vão desde a popularidade do Congresso perante a população, passando pelos aspectos quantitativos e qualitativos de aprovações de projetos, a relação com os demais Poderes, a transparência da atividade parlamentar, além dos sucessivos escândalos de corrupção e cassações de congressistas.

Alta reprovação do Congresso

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Vista do prédio do Congresso Nacional em Brasília . Foto: Arquivo/Paulo Whitaker/Reuters

Aos olhos da população, o Congresso também não tem sido bem avaliado. A mais recente pesquisa do Datafolha sobre o tema, que foi a campo em dezembro de 2021, mostra que apenas 10% dos entrevistados consideravam o trabalho dos deputados e dos senadores como bom ou ótimo.

Ao todo, 45% classificaram o desempenho do Legislativo federal como regular, e 41%, como ruim e péssimo ― 4% não souberam responder. Para 10%, o trabalho do Congresso Nacional é ótimo ou bom.

A série histórica, no entanto, contraria Ulysses Guimarães e Lula. A pior avaliação medida pelo instituto não foi registrada na atual Legislatura, mas na anterior. Em 2017, a aprovação foi de 5%. A reprovação chegou a 60%.

Quantidade x qualidade das leis

Uma das principais funções do Legislativo é apresentar projetos de lei (PLs), decretos legislativos, resoluções e emendas à Constituição, além de discutir e votar medidas provisórias (MPs).

Em suas campanhas, congressistas costumam exaltar a quantidade de projetos aprovados de sua autoria.

Cientista político e pesquisador do Centro de Estudos Legislativos da UFMG, Fernando Meireles aponta que a aprovação de proposições de impacto “pode ser considerada uma coisa positiva da atual legislatura”.

“Podemos considerar a quantidade de marcos regulatórios aprovados como um diferencial positivo. Foi aprovada a reforma da Previdência, que é um projeto grande, uma PEC [Proposta de Emenda Constitucional, que precisa de três quintos da Câmara e do Senado para ser aprovada, em dois turnos]”, afirma.

Em termos quantitativos, a legislatura de 2011 a 2014 aprovou 795 proposições, segundo o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). Nesse período, a Câmara foi comandada por Marco Maia, do PT (2011-2012), e por Henrique Eduardo Alves, do PMDB (2013-2014), enquanto no Senado o presidente era José Sarney (PMDB-AP).

A legislatura seguinte, de 2015 a 2018, que aprovou o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), registrou 765 matérias aprovadas ― a menor produção legislativa do período pós-redemocratização. Os presidentes da Câmara no período foram Eduardo Cunha, então no PMDB (2015-2016) e Rodrigo Maia (então no DEM-RJ), enquanto o Senado era presidido por Renan Calheiros (PMDB-AL).

No levantamento parcial do Senado Federal, sem contar o ano de 2022, a atual legislatura — iniciada em 2019 e que termina em fevereiro de 2023 — aprovou 534 proposições.

Meireles destaca que o número de proposições aprovadas, por si só, pode não ser um dos mais acurados critério para avaliar uma legislatura.

“Pode ser que o Congresso esteja aprovando muitas leis em um período específico, que demanda algum tipo de regulamentação ou criação de marco legal. A gente teve recentemente o caso da Covid-19, que provocou uma inundação de legislações”, pondera.

A cientista política e professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Graziella Testa concorda que a criação de leis com excessiva celeridade pode representar riscos.

“Existe uma literatura que mostra que um projeto de alto impacto precisa ser muito bem pensado e discutido no seu processo legislativo. O risco de se produzir muita legislação de forma muito ágil é produzir um número grande de leis que não sejam boas”, diz.

Fonte: CNN Brasil

Foto: Paulo Sérgio/Câmara dos Deputados

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